Da Organização Militar

O recrutamento militar é compulsório, muitas vezes realizado com violência. O Capitão-mor seleciona os soldados a partir dos homens apreendidos. Muitos desertam fugindo para os sertões. A elite colonial se vê livre do alistamento forçado, que dura em média 10 anos. Estão desincumbidos também do serviço militar os filhos únicos de viúvas e de lavradores.

A força militar colonial é dividida em três linhas: Tropas de Primeira Linha, Tropas Auxiliares e Corpos de Ordenanças. Essa estrutura não segue o estipulado pelos regimentos, mas a sua capacidade de mobilizar um grande contingente, liderados por fazendeiros militares, não deixa nada a dever aos reinos europeus, considerando as dificuldades dos caminhos coloniais.

Tropas de Primeira Linha

A Tropa de Primeira Linha é formada por soldados profissionais, sempre de prontidão, criada em 1641. O Regimento das Fronteiras, adotado na colônia em 1653, regulou sua organização, definindo suas normas e soldos. São tropas regulares e remuneradas pela Coroa. A maioria de seus integrantes veio da Metrópole. Os comandantes são fidalgos nomeados pelo Rei. Sua unidade é o terço.

Cada terço das tropas é comandado por um Mestre-de-Campo, mantidos sempre em armas, exercitado e disciplinado. Na colônia, o terço torna-se praticamente propriedade do nobre que o comanda. O Mestre-de-Campo precisa ser experiente e ter reconhecimento militar. Seu auxiliar e segundo em comando é o Sargento-Mor, que por sua vez é auxiliado por um Alferes. A infantaria é divida em lanceiros, arcabuzeiros (disparo de curto alcance) e mosqueteiros (disparo de maior alcance).

As táticas desenvolvidas no Velho Mundo se aplicam ao embate com outros exércitos do mesmo gênero, semelhantes em táticas e armamentos. Em Santa Cruz, as batalhas contra nativos e quilombolas exigem táticas distintas. O Terço na colônia tampouco é composto pelos dois mil integrantes do modelo europeu. Para isso, é preciso reunir as milícias e ordenanças, e mesmo assim pode não ser o suficiente.

Tropas Auxiliares

As Tropas Auxiliares, mais conhecidas como Milícias, são formadas por recrutas não remunerados, arrebanhados na própria colônia. Os homens são recrutados em situações de confronto, como nas guerras contra os nativos.

Cada capitania tem sua organização própria. Em São Sebastião, por exemplo, não há milícia. Os oficiais são escolhidos dentro da população civil. Cada miliciano arca com os custos de seu próprio equipamento. O serviço é obrigatório e não remunerado, mas os milicianos recebem treinamento de guerra.

Ordenanças

Os Corpos de Ordenança são a organização militar mais antiga da colônia, repartidas em companhias. São compostas por toda a população masculina entre 16 e 60 anos não alistada nas tropas de linha e nas milícias, excetuados aqueles que se beneficiam de dispensa. As companhias são estacionárias, não devendo atuar além de seu distrito. A função não é permanente nem remunerada, mas a companhia deve ser rapidamente mobilizada quando a defesa da vila assim o exige. A todos os seus membros é permitido possuir armas e praticar com elas aos domingos e dias santos.

Não há um recrutamento formal, apenas uma listagem dos interessados, pois se trata de uma forma de ascensão social. Além da função militar, cumpre também papel administrativo, como obras públicas, coleta de tributos e controle dos nativos. Atuam também no recrutamento civil. Com isso ganham prestígio e pouca responsabilidade em contrapartida.

O comando das companhias é exercido por senhores de terra, e cabe a eles organizar a defesa de seu distrito e exercitar periodicamente os seus comandados. Todas as companhias são convocadas periodicamente para se apresentar, mas na prática são mal equipadas e mal treinadas. O comando geral das Ordenanças cabe ao Capitão-Mor.

Nativos, Negros e Mestiços nas Tropas

Os Tupi, ao longo do século XVI, foram a principal força de guerra da colônia. Atualmente há uma aliança entre os senhores de engenho e o governo para que os escravos negros sejam mobilizados para os esforços de guerra. Assim, apesar da legislação estabelecer o contrário, não é incomum ver um cativo transitando sozinho e armado, apesar disso ser fonte de temor para as autoridades. No planalto de Piratininga, avistar mestiços e nativos armados nas vilas faz parte do cotidiano.

Escravos negros podem ser usados em qualquer circunstância, até mesmo no combate contra quilombos. Na região mineira, um senhor de engenho e minerador é sempre seguido por um bem treinado e armado grupo de 20 escravos. Todos que lutaram ao lado dele e de sua inusitada milícia não notaram qualquer receio de sua parte em ser atacado ou traído por qualquer um de seus escravos. Tal segurança não é fruto de coerção, mas de negociação. Muitos senhores garantem a dedicação dos negros em combate com melhorias nas condições de cativeiro ou promessas de alforria.

Ao lado dos terços de brancos, aparecem terços de pretos, de mulatos e de nativos. Na luta contra os Neerlandeses, o Capitão Henrique Dias se cobriu de glória à frente de seu terço de pretos. Em homenagem a este heroico e bravo terço, as capitanias da Bahia de Todos os Santos, Pernambuco e de São Sebastião possuem um terço composto unicamente de negros, conhecidos como “os Henriques”.

A necessidade de manter as terras conquistadas e impedir o avanço de estrangeiros sobrepujam preconceitos, permitindo negros escravos e forros a portar armas, montar cavalos, utilizar fardas e ter foro militar. Particularmente os negros nascidos na colônia, que possuem status distinto daqueles vindos do Continente Negro.

A condição de liberdade passou a ser critério de admissão ou ascensão dos negros em algumas tropas. Entre os milicianos há muitos artesãos, oficiais mecânicos e pequenos agricultores negros. Alguns investidos de cargos e posições nas Ordenanças e outros servindo como soldados. Em qualquer dos casos, tais posições conferiam algum prestígio, honras e privilégios.

Published in: on 10 de janeiro de 2019 at 19:08  Deixe um comentário